Sururus de convescote: montagem e pré-estreia

O planejamento inicial para os Novos sururus e quiprocós de um convescote chumbrega avançou com a escrita de 25 módulos ("platôs") para piano e flauta. Os módulos foram escritos com partes síncronas entre piano e flauta, embora, na execução da peça, essa sincronia não ocorra necessariamente.

Explico: a proposta inicial de transformar a performance da peça em uma espécie de improvisação guiada foi mantida e concretizada por meio do sistema de chapas metálicas e fragmentos da partitura com imãs.

O pianista Dario Rodrigues em ensaio de "...sururus...", Mossoró-RN, 27 de março de 2019.

Foram designados assistentes para o pianista e a flautista, dedicados a manter a realização dos sorteios de módulos ao longo da performance.

Assistentes sorteiam módulos durante o ensaio de "...sururus..." em Mossoró-RN, 27 de março de 2019.

Assim, devido à imprevisibilidade do sorteio, a coincidência de módulos entre flauta e piano tornou-se uma contingência a ser concretizada ou frustrada pelas circunstâncias de cada performance. Entretanto, as combinações fortuitas entre módulos distintos proporcionam a proliferação de possibilidades rítmicas e harmônicas dos materiais musicais. Os performers moldam o resultado expressivo com suas decisões locais sobre ordem e quantidade de repetição na execução dos módulos, bem como a partir da liberdade de buscar relações entre as partes, por meio de nuances da dinâmica e articulação.

Os materiais sonoros para a peça foram complementados com um sessão de gravação realizada com o Coletivo N·S·L·O e os assistentes durante a oficina de montagem da peça em Mossoró-RN. Coletados a partir de provocações referentes à memória e à noção de deslocamento ou pertencimento de sons ou gêneros musicais, esses materiais serviram de base para difusões sonoras realizadas como bricolagens.

Os demais aspectos do planejamento ─ organização do espaço e a estrutura ─ sofreram alterações em relação ao que estava previsto no planejamento inicial.

Quanto ao espaço, a principal alteração foi a exclusão da estação do microfone. Durante a montagem, pareceu-me inviável a implementação desta estação, tanto quanto à definição de critérios para seu uso, quanto no sentido prático dos deslocamentos dos performers. Os demais elementos do planejamento foram implementados de acordo com a realidade do espaço físico.

Quanto à estrutura, houve uma alteração na ordem dos 5 momentos previstos no planejamento inicial. Conforme definições realizadas no processo de montagem, o avanço da performance é segmentado a partir de pontos de virada, nos quais um dos agentes da performance introduz um novo elemento. A estrutura para realização da peça ficou assim definida e detalhada:

Assistente da flautista realiza primeiro sorteio e disponibiliza módulos da parte de flauta (depois continua sorteando ad libitum);
Flautista inicia execução instrumental;
Após um tempo, e aproveitando um momento de mudança no plano sonoro da flauta, um assistente entra trazendo um objeto obsoleto que expõe à plateia;
Os demais assistentes entram e expõem também seus objetos obsoletos tomando seus lugares no espaço entre instrumentistas e plateia;
Flautista continua execução solo por um tempo;
Entra primeira difusão sonora;
Assistentes começam a realizar ações, interagindo com seus objetos, enquanto pianista começa a aplicar rótulos;
(Assistente do pianista realiza primeiro sorteio e disponibiliza módulos da parte de piano, continuando a sortear posteriormente, ad libitum);
Após algum tempo, a primeira difusão sonora é retirada;
Assistentes retornam a seus lugares e pianista retorna ao piano;
Pianista começa a tocar a flautista para de tocar;
Pianista continua execução solo por um tempo;
Entra segunda difusão sonora;
Flautista começa a distribuir cartões com frases e expressões obsoletas;
Assistentes e plateia criam um burburinho vocal, jogando com as frases;
Depois de um tempo, a segunda difusão sonora é retirada;
Assistentes recolhem todos os cartões e cessa o burburinho;
Flautista volta a tocar, unindo-se ao pianista;
Ambos tocam por um tempo;
Entra a terceira difusão sonora, o duo segue tocando;
Depois de um tempo, a terceira difusão sonora e retirada;
Assistentes do pianista e da flautista param de sortear, deixam os módulos restantes do último sorteio disponíveis para os instrumentistas;
Flautista e pianista continuam tocando por um tempo e, em consenso, encontram um final para a peça.

Note-se que a escrita da peça possui dois níveis distintos: 1- partituras fragmentadas dos módulos para execução instrumental, cartazes para o jogo dos rótulos e cartões para o jogo das expressões obsoletas; 2- roteiro geral para implementação da performance.

Por meio da montagem e da pré-estreia concretizadas em Mossoró-RN, na semana passada, foi consolidada a proposta composicional da peça. A possibilidade (e até necessidade) de continuar agregando materiais sonoros, verbais e visuais para concretização das próximas execuções é um horizonte instigante e desafiador para as próximas etapas da turnê e da continuidade do projeto no futuro.


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